quinta-feira, 7 de março de 2013


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Cadê o cinema brasileiro? 

Num cenário global marcado por novo avanço dos blockbusters norte-americanos, bilheteria de filmes nacionais patina e desperta debate sobre formas mais inteligentes de incentivo

Por Maria do Rosário Caetano, no Brasil de Fato

Só 10% dos 146 milhões de ingressos vendidos nas 2.500 salas de cinema do país, ao longo de 2012, foram destina­dos a filmes nacionais. Já o cinema vin­do dos EUA vendeu, aqui, 120 milhões de ingressos. O restante coube a filmes de outras nacionalidades (europeus, asi­áticos e latino-americanos).
O dado é alarmante. No primeiro ano da Era Lula, marcado pela esperança em um novo tempo para o audiovisual brasi­leiro, 22% dos ingressos vendidos no país destinaram-se a filmes nacionais. Um de­les, que alcançou grande êxito, foi Cidade de Deus, de Fernando Meirelles. Houve quem, em clima de otimismo, acreditas­se que o cinema brasileiro deixaria de ser um estranho em seu próprio mercado. E sonhou-se, até, com desempenho similar ao dos anos de 1970, quando mais de um terço dos ingressos vendidos no país des­tinavam-se a filmes nacionais.
Houve outro ano (2011) em que a taxa de ocupação não foi desanimadora: 19%. Este desempenho se deu quando Tropa de Elite 2 vendeu mais de 11 milhões de ingressos e tornou-se a “maior bilheteria do cinema nacional” (desbancando Do­na Flor e Seus Dois Maridos, que ven­dera 10,9 millhões de tíquetes em 1976). Não é saudável que um único título res­ponda pelo bom desempenho das bilhe­terias de um país. Quanto mais diversifi­cada for a carteira de um centro de pro­dução audiovisual, melhor.
Fora os anos de 2003 e 2011, os demais foram preocupantes, pois variaram – como mostra o Boletim Filme B – entre 8% (2002) e 14,2%(2009). Com o aumento das salas de cinema e o crescimento do público cinematográfico (maior a cada novo ano), as estatísticas mostram que  o cinema estadunidense, como de cos­tume, continua concentrando lucros ca­da vez maiores. Fora a Índia (que de­tém mais de 80% do mercado interno) e a França, que chega a empatar com os EUA em número de ingressos (45% para os filmes franceses, incluindo os da Áfri­ca francófona; 45% para os oriundos dos EUA; e os 10% restantes para o cinema asiático e latino-americano). Até a Chi­na, que controla a entrada de títulos es­tadunidenses (20 por ano) está perden­do terreno. Os blockbusters made in USA estão atraindo mais espectadores que a prolífica produção made in China.
O Brasil lançou, ano passado, 83 lon­gas-metragens. Destes, apenas cinco ultrapassaram a barreira do milhão de in­gressos. Quatro são as comédias: Até que a Sorte nos Separe, E Aí…Comeu?, Os Penetras e De Pernas pro Ar 2 (este alcançou ótima arrancada com 1 milhão de ingressos nos dez últimos dias do ano passado, mas a maior parte de seu público será computada neste primeiro tri­mestre de 2013). Só um drama – Gonza­ga, de pai pra filho – conseguiu romper a difícil barreira do milhão (1,5 milhão de tíquetes).
Que brasileiro gosta de comédia, não há dúvida. O sucesso das chanchadas nos anos 1940/50, o êxito das comé­dias caipiras de Mazzaropi (nos anos de 1960/70) e o triunfo arrebatador das co­médias infanto-juvenis dos Trapalhões são provas mais que suficientes. Mas ne­nhuma cinematografia vai bem se culti­va um só gênero.
A hegemonia dos EUA, que é planetá­ria, se deve à capacidade do país em pro­duzir filmes de todos os gêneros (sem descuidar do público infantojuvenil), em escala industrial, com altíssimos in­vestimentos em propaganda, escala­ção de atores e diretores conhecidos no mundo inteiro e contando, ainda, com a mais poderosa máquina de distribuição já montada pela centenária indústria do audiovisual.

Apoio do Estado
Todo país tem direito a gerar suas pró­prias imagens. Seja o pequenino Uruguai (com pouco mais de 3 milhões de habitantes), seja a Índia ou a China (ambos países com mais de um bilhão de pessoas cada um). O Brasil, um país de quase 200 milhões de habitantes, tem lutado, há mais de um século, pelo fortalecimento de sua indústria audiovisual. Mas as dificuldades parecem não ter fim.
O cinema brasileiro – tanto o de empe­nho artístico-cultural, quanto o “comer­cial” – vive de subsídios governamen­tais. Ou seja, de leis do mecenato. Como aqui o empresariado não tem hábito de incentivar a produção de bens culturais (quando o faz, quer – além de altos des­contos de impostos – farta publicidade em forma de merchandising ou difusão de sua logomarca), quem acaba bancan­do o grosso da produção são empresas ou bancos estatais (Petrobras, Eletrobrás, Banco do Brasil, CEF, Chesf, BN­DES, Banco do Nordeste, etc). Em troca de apoio financeiro, as estatais e as em­presas privadas (quando estas investem nos filmes) exigem que suas marcas apa­reçam com destaque nos letreiros, fato que se tornou motivo, em festivais internacionais, de chacota. Tantas são as lo­gomarcas que cansativamente antece­dem o início da narrativa.

Luta desigual
No final dos 1990, Walter Salles, que viu o drama Central do Brasil vender mais 1,5 milhão de ingressos (depois de ganhar o Urso de Ouro, no Festival de Berlim, e concorrer a dois Oscar), espe­rava que chegássemos ao século 21 com pelo menos 25% do mercado interno. E que este número crescesse a cada ano. O cineasta até sugeriu que nossos legisla­dores estudassem a taxação do filme es­trangeiro lançado com mais de 500 có­pias (hoje, há blockbuster estadunidense lançado, aqui, com 1.200 cópias). Os recursos auferidos com a taxação se­riam reinvestidos na produção audiovi­sual brasileira. A ideia não foi adiante no parlamento, nem encontrou defensores no governo FHC, nem no governo Lula, nem no governo Dilma.
Para abrandar a difícil relação da TV com o cinema brasileiro, o Congres­so Nacional aprovou a Lei do Cabo (Lei 12.485, em vigor há quatro meses), que exige a exibição de 2 horas e 20 minutos semanais de produção brasileira em ho­rário nobre. Isto nos canais por assina­tura e num primeiro momento. Depois deste período de adaptação, o tempo su­birá para quase três horas e 30 minu­tos semanais. O que, convenhamos, não é muito, se levarmos em conta que ca­da canal emite mais de 160 horas de pro­gramação por semana. Na maioria abso­luta das telinhas, 95% dos filmes e programas exibidos têm os EUA como ori­gem.



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