quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

A pedagogia do medo

buscado no Passa Palavra

É basicamente o apego ao medo que nutrimos. 

Por Ronan
(Para Conchita)

É basicamente o apego ao medo que nutrimos
Medo de não ter onde morar
Medo de não ter o que comer
Medo que sejam poucos ou se extingam os sorrisos na rua
Medo de ser atropelado, de ser assaltado, de perder o trem, de se afogar na praia
Medo de que ácaros consumam aquele livro que tanto tememos que nunca lemos
Medo de que algum rato invada a casa ou baratas passeiem sobre o bolo predileto
Medo do corpo que vai envelhecendo e recebe cada vez menos valor social
Medo de que um dia não se consiga mais dormir ou a memória desapareça
Medo de que o olhar no metrô não seja correspondido
Ou que não sejamos amados pelos filhos, pelos pais
Medo de partir, medo de ficar, medo de ficar ou partir e não dar certo
Medo do dia, medo da noite
Ou que o Datena apareça à nossa porta numa segunda ensolarada
Ele traz um grande jornal e teu sorriso macabro
Corremos para as lojas e já não há espelhos para comprar
Resta-nos um terror em DVD, porque gostamos do medo seguro
Medrosos, suplicamos por amizades acabadas, por sucessos efêmeros, por companhias tolas, por um amor tão detonado quanto restos de placenta
Restou-nos o alimento do medo
Uma raça de covardes faz cirurgias plásticas e consome cocaína, antidepressivos e telas tão grandes que não cabem na sala
Medrosos, vendemos a vida de segunda a sexta para que nos finais de semana consumamos o belo em lojas de 1,99, outro vai pagar para que tenha carinho ou seja ouvido
Nós cantamos o medo
Nós vestimos o medo
Nós ritualizamos o medo
E aos nossos ensinamos a arte de temer: você não vai passar no vestibular, esqueça a namorada
O medo, a suprema pedagogia do nosso tempo

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Tela de James Ensor

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