sábado, 11 de fevereiro de 2012

Monitoramento virtual

buscado no decomposta


Hoje pela manhã, ao logar no gmail, fui informada de que o Google fará uma modificação em seus termos de privacidade. Quase todo mundo sabe que o Google é uma das empresas que mais armazena dados pessoais de seus usuários e isso tem gerado um debate interessante sobre vigilância na internet. Pessoalmente, sou uma ex-usuária google, que ainda mantém (ou mantinha!) um endereço no gmail para acompanhar algumas listas que, por serem muito movimentadas, atrapalhavam a dinâmica do riseup, meu atual servidor de e-mail.
E o que mudou? O que fizeram foi unificar os mais de 70 termos de privacidade que o Google tinha para cada um dos seus serviços em um só. Isso, além de facilitar trâmites judiciais, torna mais simples para o Google associar informações de usuários de diferentes serviços, melhorando seu banco de dados e, lógico, aumentando o lucro.
Mas talvez o mais interessante nem seja saber o que mudou, mas sim o que não mudou. Além de captar as palavras chave de todos os e-mails e dos termos de busca e de ter acesso ao tipo de sistema operacional e ao modelo de hardware, o Google também triangula as redes wireless ao seu redor para saber sua localização. Para quem utiliza internet via celular, ele ainda guarda os destinatários e horários de suas ligações telefônicas e identifica os dados dos SMS.
E o que o Google faz com isso? Basicamente, ele utiliza as informações pessoais para refinar os anúncios que aparecerão para cada pessoa, a partir de suas preferências. Isso faz com que o usuário seja muito mais propício a clicar em um desses anúncios e, assim, o Google fatura milhões e milhões diariamente. É engraçado como parece haver um certo orgulho no discurso do Google de que “nunca venderemos qualquer informação pessoal de nossos usuários”. É lógico que não, o lucro seria muito menor.
É certo que, ao utilizarmos a internet, sempre haverá um elo na corrente de comunicação capaz de saber, por exemplo, os IPs aos quais nos conectamos. De certa forma, é impossível que ninguém tenha acesso àquilo que trabalhamos na rede, entretanto, o problema aqui não é somente ter acesso às informações, mas também armazená-las (o Google deixa bem claro que todas as suas informações são gravadas e se, por acaso, você quiser excluí-las, o máximo que podem fazer é apagá-las do disco em uso, o que estiver no backup nunca será excluído). Essa prática acaba por criar um imenso banco de dados mundial (cada vez mais detalhado), e isso é um prato cheio para a vigilância governamental. Todo mundo acha maravilhoso que a Polícia Federal, a partir de 2006, pôde capturar pedófilos através das informações caçadas no orkut, pelo menos até lembrar que, para isso, ela acabou tendo acesso irrestrito sobre todos os usuários da rede. De forma semelhante, o governo americano teve acesso, sem precisar de mandato judicial, a todas as informações de Jacob Appelbaum (voluntário da WikiLeaks e desenvolvedor do projeto Tor) e de mais 5.593 usuários do Google só no primeiro semestre de 2011. Se acrescentarmos ainda as requisições de governos de outros países, o número de pessoas que tiveram seus dados cedidos pela empresa, nesse período, passa dos 10.000.
É óbvio que nem todos esses usuários são pedófilos ou homicidas. O exemplo da caçada ao grupo WikiLeaks deixa claro como essa é uma arma usada contra qualquer pessoa ou grupo tido como “subversivo”. Lembro-me quando percebi que, durante debates em uma lista de e-mail feminista, havia pessoas que nunca usavam a palavra ‘aborto’ grafada por completo, para não correrem o risco de serem indexadas caso a informação fosse requisitada. Na época, achei um pouco paranoia, mas agora, alinhando  esses abusos de autoridade com as manobras judiciais de vigilância sobre o aborto, começo a acreditar que aquela era uma precaução a ser considerada.


O Google, é de se imaginar, não é o único a monitorar seus usuários. A Apple, o Yahoo, a Microsoft, e a AOL, apesar de não estamparem tanto a mídia, também praticam o mesmo jogo. Isso sem falar nas redes sociais, como o Facebook, que são um pepino mais retorcido ainda. Mas, antes que os preguimistas (mistura de preguiçosos e pessimistas) soltem a  velha constatação do “todos são maus, não há nada que se possa fazer”, acrescento que sim, senhoras e senhores, existem alternativas para quem as procura, e elas são variadíssimas.
Primeiro de tudo, convém configurar seu navegador (normalmente eles vem bem fraquinhos no que diz respeito a privacidade), isso significa ativar a limpeza de cookies ao desconectar e desabilitar os cookies de terceiros . Além disso, é possível instalar alguns complementos (no Firefox), como  GoogleSharing, ShareMeNot, https-everywhere, ad-block plus e noscript. Para um anonimato mais avançado, existe a rede Tor, que labirintifica a conexão entre seu computador e os servidores dos sítios que você acessa, tornando o rastreamento quase impossível (em contrapartida sua conexão provavelmente ficará mais lenta). Como buscador existe o Scroogle, que funciona através de uma rede de servidores que intermediam sua conexão com o Google, impossibilitando que a empresa te rastreie (ela encontrará o IP do Scroogle, não o seu). E para fugir dos servidores de e-mail enxeridos, o riseup é uma excelente alternativa.


Para além da justificativa preguimista, outra que escuto muito é  a dos preguinferentes (mistura de preguiçosos com indiferentes), que normalmente repelem as críticas com um “eu não me importo, não tenho nenhuma informação para esconder”. Aqui quase se escuta o eco das declarações de Eric Schmidt, diretor executivo do Google, ao ser questionado sobre a falta de privacidade da empresa: “if you have something that you don’t want anyone to know, maybe you shouldn’t be doing it in the first place” [se você tem alguma coisa que não quer que ninguém descubra, talvez você é que não deveria estar fazendo isso, em primeiro lugar]. Porém, veja como a discussão acaba sendo desviada quando se entra nesses mérito: ninguém está falando sobre ter algo ou não a esconder, o questionamento é quanto à privacidade. Uma pessoa tem toda a legitimidade, por exemplo, de ser contra à instalação de câmeras dentro de sua própria casa, e pouco importa se ela tem algo a esconder ou não, ela só não quer ser vigiada – vontade que não deveria ser tratada de forma tão alienígena assim. E o pior de tudo é que, ao mesmo tempo em que se repele o questionamento com esse discurso furado, as pessoas vão se acostumando ao monitoramento, à falta de privacidade, ao estreitamento da liberdade. Aos poucos, o controle se transforma em banal, a internet vira uma ferramenta de vigilância, e o indivíduo que critica vai passando de anormal e paranoico, a subversivo e terrorista.


-mais informações interessantes sobre o google: the problem with google

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